De pronto é importante desmistificar esse discurso de que falar em impeachment é defender um golpe.
Do ponto de vista jurídico, Impeachment é um instrumento da democracia, previsto no artigo 85 da Constituição Federal para os casos de cometimento de crimes pelo(a) Presidente da República e regulamentado pela Lei n. 1079/50.
Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
I – a existência da União;
II – o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III – o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV – a segurança interna do País;
V – a probidade na administração;
VI – a lei orçamentária;
VII – o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento.
Do ponto de vista político, o PT e seus aliados já foram às ruas para defender o Fora Collor e depois o Fora FHC e não se viu nessa atitude uma tentativa de golpe, mas sim um instrumento da luta democrática.
Assim, quem já defendeu Fora Collor e Fora FHC não pode chamar de golpe o Fora Dilma.
Acontece que o Impeachment é uma situação excepcionalíssima e não se confunde com o Recall. O recall – instrumento presente na legislação de alguns estados americanos por inspiração da Carta de Los Angeles por Theodore Roosevel (1903) e que no Brasil figurou no Decreto de 16 de fevereiro de 1822, por influência de José Bonifácio – é a possibilidade de revogação de um mandato eletivo por inépcia ou descumprimento dos compromissos de campanha. Já o impeachmet pressupõe o cometimento de crime de responsabilidade, como já dito, os previstos no artigo 85 da Constituição Federal.
De uma forma simplória, o impeachmet seria a perda do mandato pelo Congresso por conta do cometimento de crime e o recall seria a perda do mandato por incompetência, fruto de uma decisão direta do povo.
A legislação brasileira prevê impechment, mas não prevê recall. Assim, no Brasil, não há hipótese legal de perda de mandato por descumprimento de promessas de campanha ou por incompetência.
Dito isso, é preciso entender que para um Presidente da República perder o mandato é preciso a existência de requisitos sociais, políticos e jurídicos que justifiquem o impedimento.
Quando Collor perdeu o mandato ele não tinha apoio dos movimentos sociais e nem do povo (social), não tinha maioria no Congresso (político) e fora acusado de um crime de responsabilidade relacionado à compra de um veículo com sobras de campanha (jurídico).
A situação de Dilma, pelo menos até agora, não é tão extrema. Ainda existe forte apoio nas bases de sindicatos e entidades de classe, ligadas ao petismo e seus aliados, a maioria no Congresso ainda é confortável e ainda não surgiu nenhum crime praticado pela presidente no exercício do atual mandato.
Portanto, o FORA DILMA é uma palavra de ordem retórica da luta política legítima da oposição democrática, mas sem possibilidades reais nas atuais circunstâncias. O que não quer dizer que esse cenário não pode mudar com a crescente insatisfação popular e o avançar das investigações da Operação Lava à Jato.
Sobre a convocação para 15 de março, penso que faz mal à oposição democrática a falta de firmeza e uma certa leniência com discursos equivocados e retrógrados de defensa de ditadura ou intervenção militar.
Falta à oposição democrática rechaçar firmemente qualquer manifestação em defesa de saídas que não passem pela decisão da maioria do povo nas urnas e pelo respeito à Constituição.
Eu estou cansado das mentiras, da demagogia e do populismo do governo Dilma, mas não quero andar pro passado, pro tempo do autoritarismo e da tortura, pro tempo no qual a reação aos questionamentos dos erros do governo eram a violência e a morte.
Todos os atos de oposição democrática terão o meu apoio com a mesma firmeza com que todas as tolices em defesa de governo militar ou qualquer saída fora do que determina a Constituição terão o meu veemente repúdio.
Se vou participar do dia 15? Irei ao ato. Mas me retirarei imediatamente se tiver um só cartaz em defesa de intervenção militar, ditadura militar ou qualquer coisa parecida com essas bobagens.
A democracia pra mim é um bem inegociável. Com ela erramos e temos o direito de corrigir os rumos. Na ditadura, se o governo erra, o preço pra quem tenta corrigir os rumos é a violência, a tortura, o exílio e a morte.
A pior das democracias é melhor que a melhor ditadura!