Parece até brincadeira o ocorridoneste domingo, com a eleição fracassada de conselheiros que vão assumir as bases do Conselho Tutelar de Manaus.
O “circo” não foi adiante porque durante a tarde, o MPE-AM já havia sinalizado que iria pedir a anulação do pleito, por ter recebido dezenas de denúncias e reclamações sobre irregularidades apontadas durante o processo. Entretanto o próprio Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) em reunião posterior com o MP no final do dia, optou pela anulação da eleição unificada.
Hoje, quem decidiu sair para votar (eleição não é obrigatória) em algum candidato para assumir uma das 90 vagas para o conselho tutelar, constatou a grande desorganização da Prefeitura de Manaus. Foram verdadeiros absurdos que em pleno século XXI, não se pensariam serem possíveis de acontecer.
Talvez o pior das irregularidades, foi o apontamento de fraude de manipulação de votos. Houve relatos constantes de pessoas com 3 ou 4 títulos de eleitores, efetivando votos simultâneos, onde até mesários e presidentes de sessões estariam envolvidos.
Só este fato, demonstra a fragilidade da própria estrutura de colaboradores e responsáveis pela realização da eleição, colocando em risco a legalidade do processo.
Além deste gravíssimo relato, os cidadãos que se dirigiram para as escolas respectivas às zonas e sessões eleitorais, ao se credenciarem para exercer o ato, foram impedidos. Seus registros não constavam nas listas de eleitores daquele zona e sessão, mesmo com o documento de eleitor, portado em mãos, atestando as referências de zonas e sessões correlacionadas ao local.
Ao que parece, a coordenação do pleito só tomou ciência desta falha durante o dia, na ocorrência do processo de votação. De tal modo, que a coordenação do pleito, passou o dia revisando as listas e entregando nas zonas e sessões. Acontece que já havia prejuízo desde o começo da abertura no horário de votação, pois aquele eleitor que foi cedo votar, e não votou por este erro, não saberia que deveria retornar mais tarde mediante a lista revisada para efetivar seu voto. Um tremendo absurdo!
Enumerando as sequências de falhas ocorridas nesta frustrada eleição, a principal delas foi relacionada a logística.
A SEMASDH, frente do processo eleitoral, pasta coordenada pela Primeira Dama Goreth Garcia Ribeiro, agiu como a “trupe da bagunça”.
Primeiro, porque simplesmente alteraram alguns locais de votações, sem prévio aviso conhecimento da população. O que resultou-se em muitos equívocos pelos eleitores que se digiram às zonas e sessões predeterminadas pelo TER-AM onde costumeiramente votam, no encontro de portões fechados e nenhuma orientação.
Quando o caso não era de mudança intempestiva de zona e sessão de eleitoral, como acima exposto, era de abandono dos mesários e presidentes de sessões, por falta de alimentação.
Parece até mentira, mas não é.
Exatamente isso, mesários e presidentes de sessões eleitorais abandonaram algumas escolas, porque não receberam alimentação prevista pelo órgão da Prefeitura. Tendo encerrado as atividades em algumas zonas eleitorais por volta das 14:00hrs.
Neste caso, os eleitores relataram portões fechados, ou salas destinadas as sessões completamente vazias. Sem dúvida, é a maior prova de falta de organização e descaso, com a população de Manaus.
Não é de hoje que o Conselho Tutelar vem sofrendo com falta de estrutura e metodologia de trabalho. Assuntos constantemente levados em pauta e reivindicados pelos próprios conselheiros que atuam na fiscalização e proteção da família, da comunidade e especialmente das nossas crianças e adolescentes.
Vulneráveis que deveriam receber uma atenção e carinho singulares pelos nossos gestores, como manda nossa Constituição e Legislação Especial.
Neste ano, o edital para o processo eleitoral de escolha dos conselheiros para o quadriênio 2016/2019, ampliou o número de vagas, passando de 45 para 90 vagas, duplicando o quadro, esperado com bastante expectativa pela população e por entes que se dedicam ao tratamento, apoio e tutela de crianças e adolescentes.
Muitos dos candidatos que se submeteram ao processo, já se queixam do planejamento, tempo e custos pessoais de campanha, que foram jogados ao lixo por este desastroso dia.
Lamentam agora, pela desvantagem de concorrência que se distanciou, daqueles candidatos (por interesses diversos da essência do Conselho Tutelar) que foram subsidiados por “financiamentos” que os beneficiaram com o cancelamento, pelo “fôlego” financeiro superior que estes insuficientes.
A Prefeitura de Manaus hoje ensinou, de forma ridícula (como aqueles tutoriais encontrados no Youtube de “como não se deve fazer algo”) o procedimento eleitoral de escolha de conselheiros tutelares, verdadeira afronta ao processo democrático.
Neste domingo, retrocedemos no tempo, lá para os “anos 80”, em que estas “aberrações eleitorais” eram comuns e inerentes a tecnologia disposta aos tipos de sufrágio. Presenciamos hoje, o que nossos avós e pais viveram naquela época (houve casos de extravio de urnas eleitorais).
Este é o retrato de uma cidade comandada por um Prefeito que administra às margens ultrapassadas da gestão pública ideal.
Tudo bem, as ocorrências neste domingo não foram exclusividade da cidade de Manaus, existindo notícias em outros estados, de anormalidades similares. Entretanto, as irregularidades em Manaus foram desproporcionais ao que poderia ser tolerável, o que deixou evidente a incompetência destes gestores.
O pior dos efeitos ao momento, talvez seja suportado pelo povo. O orçamento público empregado na organização e realização do pleito, gerou despesa inútil com o cancelamento desta, duplicando agora, com remarcação de nova eleição.
É preciso mudar este cenário. Não se pode admitir “aberrações” como estas que se mostraram hoje, é muita deficiência de zelo com a coisa pública. Talvez o que realmente falta para esta Prefeitura defasada, é consciência.
Eleições como esta, deveriam ter uma cautela especial por parte da Prefeitura. Os critérios de habilitação de um conselheiro tutelar, são frágeis. A Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) em seu art. 133 e incisos prevê que os requisitos para ser um conselheiro tutelar deverão ser de uma reconhecida idoneidade moral, idade superior a 21 anos e residir no município que atuará como membro do Conselho Tutelar.
Em Manaus, acrescenta-se os critérios de experiência na atividade de defesa, atendimento ou promoção dos direitos da criança e do adolescente, com o mínimo dois anos de trabalho, e participando de uma prova objetiva e subjetiva, que habilitará para a eleição. Para ser sincero, este processo de provas, é sempre visto com muita suspeita sobre sua imparcialidade.
Portanto, mais do que necessário, deve a Prefeitura, encarar com seriedade esta eleição, com exercício logístico e fiscalizatório, decente e eficiente.
As eleições serão remarcadas, e assim, vamos acompanhar o desempenho Prefeitura. Esperamos sinceramente que se tenha uma postura diferente deste domingo, com um pouco mais de respeito e decência à população de Manaus.
Contudo, este vai ser lembrado como um dia frustrante para a democracia, para a família e para comunidade.
Davi Martins
Empresário e acadêmico do Curso de Direito da Universidade Federal do Amazonas – UFAM.